XXIX
Archie abriu a porta de ferro.
— Amy?
Está aí?
Nenhuma
resposta.
Entrou na
sala e deu uma vasculhada. Estava tudo bagunçado, bem mais que o normal. Havia sucata
aos montes no chão, e as ferramentas da estante estavam espalhadas. Archie
concluiu que alguém derrubou a estante e ao erguê-la de novo, obstruiu a
passagem do quarto.
Gritou
para que os outros entrassem, era seguro ali. E se ajoelhou ao lado de um homem
caído. Viu que ele estava vivo, mas muito bem desmaiado. Perguntou-se se foi
Amy que fez aquilo.
Eles
tiveram dificuldade para passar pela sala de estar, no térreo. Havia muitos
homens lá, a maioria feridos. O lugar tinha se tornado uma enfermaria, e
inclusive havia cirurgias improvisadas em andamento.
Mas agora
eles estavam ali, salvos. Era só manter a porta bem fechada, e não fazer
barulho… mas havia seu pai. Ele ainda dava muito trabalho.
Os pais de
Theo entraram assustados, olhando todas as coisas. Ephraim foi para perto de
Archie.
— E ele?
— Desmaiado.
— Sério
mesmo que só você e sua irmã fizeram isso tudo?
— Eh, sim.
— Theo
podia ter metade da sua inteligência. Daí ele teria mais futuro e menos morenas
de olhos azuis.
Archie
riu.
— Eu sou
um desastre com as letras, se não fosse Theo…
— Certo.
Algo me diz que vocês só vão nos deixar aqui e voltar para a bagunça lá em
cima. – ele abaixou e pegou uma chave.
Ele tinha
razão.
— Conjunto
de chaves Allen, não tenho isso. Você tem um belo arsenal aqui, hã? Se seu pai
gostasse mais dessas coisas, ele não estaria emburrado desse jeito.
— Não sei.
Mas como você disse, nós vamos subir. Liv vai querer ir, acho que vai ter que
segurá-la.
Ele riu.
— Ela é
escorregadia igual a mãe. Vou tentar. Os outros garotos estão lá fora, certo? Eles…
não sei. São diferentes, parecem…
— Estranhos?
Sim. – Archie não queria prolongar isso. Levantou-se.
— Estou
preocupado com eles também. É esquisito, eu gosto deles. Até de Lyra, que eu
achei que não ia gostar.
Ephraim
deu de ombros e se levantou também.
— Theo. –
Archie chamou. – vamos.
— Sim.
— Vamos
aonde, posso saber? Vocês não vão ficar aqui? – quem perguntou foi a mãe de
Theo.
— Desculpe,
mas nós- – Liv começou.
— Você
fica. – Theo disse, autoritário, antes que Archie o fizesse.
— Como
assim, eu fico?
— Você só
nos ajudou até aqui porque não tinha escolha, Liv. Sabe disso. – Archie
argumentou.
— E deixar
vocês lá sozinhos?
— Nenhum
de vocês vai voltar lá! Não viram os soldados como estão? – Bartholomew
protestou.
Archie
virou os olhos, ignorando.
— Liv. Por
favor.
— Não,
Archie! Como é que eu vou ficar aqui com você, vocês – ela corrigiu – sozinhos
lá?
— Lílian
está lá. – Theo lhe assegurou.
— E se não
estiver? Não, eu não vou-
— Dá pra
ficar quieta aqui, Lavender? – a voz de Ephraim soou como um trovão, e ela se
calou. – Eles estão preocupados com você, não está vendo? Você vai ficar
aqui, entendeu?
Ela olhou
o pai.
— E vai deixá-los
ir? É?
Ele olhou
o filho. Olhou por um bom tempo. Confiava nele, sabia que ele seria útil. Que
ele tinha que ir, por qualquer motivo.
— Sim.
Liv
olhou-o indignada. Depois olhou Archie.
— Só se
você me prometer que vai voltar sem um arranhão. Vocês dois. – olhou o irmão.
— Claro,
Liv. Até mais. – Archie se virou para sair, mas ela lhe tomou o pulso.
— Eu vou
ficar bem, Lav- – ele se virou para tranquilizá-la, mas ela pulou e o beijou.
Beijou, como se sua mãe não estivesse lá.
Theo tirou
os óculos, xingando meia dúzia de impropérios. Sua irmã tinha o que na cabeça?
As coisas já não estavam ruins o bastante?
Mas ele
entendia. Havia um risco de Archie subir e não voltar.
O mesmo
risco que havia de Lyra ir e não voltar, ou ele mesmo. E nem depois do último
beijo que deu nela disse que a amava. Quis dizer, até começou, mas ela não
deixou. Ela nunca deixava.
Theo puxou
Archie pela camisa sem sequer olhar pra trás, não queria ver a cara de seu pai.
Claro que ia sobrar pra ele, “Você não
vigia a sua irmã não?” e antes de bater a porta do porão ele ouviu um
furioso “Lavender!” e um “Nós precisamos conversar, Bartholomew”.
Jogou
Archie pra frente.
— Você é louco, Archibald?
— Eu? A
sua irmã não, né? – ele coçou a cabeça. – Estou morto. Morto, você tá me entendendo?
— Estou,
claro porque vai sobrar pra mim e o meu mau exemplo não é? – ele abriu os
braços.
Acabaram de subir as escadas.
— Depois
nós vemos isso, Theo. Acha que Lílian está aqui ainda? – eles começaram a
atravessar a sala, pulando os feridos. Evitando olhar, a cena proporcionaria
pesadelos.
— Creio
que sim. Ou então estávamos todos mortos. – passaram pela porta sem
dificuldade, ninguém estava realmente preocupado com eles.
Correram
ao chegar à varanda, descendo as escadas. Viram uma luz da direita, e logo
perceberam ser Lílian. Ela fingiu que não os tinha visto.
A
quantidade de autômatos e aranhas era mínima. E algo acima deles disparava em
todas.
— Amy, não
é? Naquela coisa?
Archie se
sobressaltou ao ouvir a voz do pai. Depois daquilo lá embaixo, não queria vê-lo
pelo próximo mês.
— O que está fazendo aqui? – gritou.
— Eu vim atrás da minha filha! –
Bartholomew respondeu no mesmo tom. – E depois você vai me explicar isso sobre
Lavender. Depois!
Só faltava
ele descobrir sobre Amy e Pyro, aí sim seu coração enfartaria de vez.
— É Amy
ali. – Theo respondeu. – e ela voa muito bem. – eles observaram-na avançar e
atirar com precisão. Até que ouviram cliques secos. As balas acabaram.
Amy viu
que não tinha mais balas, mas o número de autômatos tinha caído a décimos. Eles
simplesmente tinham parado de vir, e só havia remanescentes.
Ela não
sabia o que isso significava.
Pousou em
frente à escada, talvez encontrasse mais balas. Saiu de seu compartimento, e a
primeira coisa que viu a assustou.
Eram Theo,
Archie e seu pai. Os dois primeiros
estavam normais, mas o último a olhava como… ela não sabia dizer. Era
indecifrável aquele olhar.
Archie a
abraçou, perguntou se estava tudo bem com ela, e Amy respondeu automaticamente.
Estava atordoada pelo pai estar ali, e só por isso.
— O que
estão fazendo aqui? – Amy perguntou.
— Viemos
ver vocês… como saiu de lá embaixo?
— Pyro
voltou, ele não disse o que houve. Tirou-me de lá, pediu que eu ajudasse aqui e
foi pro outro lado da casa… mas eles diminuíram, só restam alguns… não sei por
que.
— Eles
encontraram o que vieram buscar. – Lílian chegou andando, Archie agradeceu por
isso. – por isso pararam.
— Mas
Chris não estava com ele? – Theo se referia ao livro.
— Chris
sumiu com Pyro, estão muito longe, a noroeste. Lyra também está lá.
Theo
suspirou de alívio ao saber dela.
— E só
pode ser o lugar onde Luce está. Os autômatos agora são poucos, vocês dão conta
deles. Eu preciso ajudá-los.
— Do que
vocês estão falando? – o pai de Archie entrou na conversa.
Lílian o
olhou. Primeiro com aquele olhar de Thrower, desconfiado e mal-humorado, e
depois a expressão élfica serena.
— Perdão,
senhor, mas não te conheço. – a voz dela mudou de um jeito que assustou Theo.
Há um minuto ela era uma general de guerra, e agora era só uma menininha.
— É o meu
pai, Lílian. – Archie disse.
— Ah.
Lílian Thrower, muito prazer. Pena eu não poder ficar mais, senhor…
—
Bartholomew. Leadengear. – ele franziu o cenho. O cabelo branco.
—…
Leadengear. Mas eu realmente preciso ajudar meus primos. Talvez em outra
ocasião menos… agitada nós
conversamos. Ah sim, o senhor não deveria estar aqui. Melhor voltar ao porão.
Ela olhou
todos ao redor.
— Amy –
seu tom voltou a ser militar – recarregue o Birdy, caso precise. Conversem com
o capitão do pelotão, ele pode arrumar umas daquelas pinhas que explodem. Tomem
cuidado, principalmente você, Theo. Lyra me mata se souber que você está aqui
fora. Volto… depois.
Ela correu
para trás da casa, e Archie novamente agradeceu por isso.
— Aquela
garota é… tão… – Bartholomew começou, mas parou. Pousou os olhos em Amy.
Ela
parecia que ia desabar. Não queria enfrentá-lo tão cedo. Olhou pra baixo, o
cenho franzido.
— Amy. –
ele chamou, mais carinhosamente que ela imaginou.
Ela ergueu
os olhos, e quando percebeu, ele estava abraçando-a.
—
Perdoe-me, Amy, por favor. – ele sussurrou ao seu ouvido, e ela mal acreditou.
Não sabia
o que dizer. Ela não pensava que ele ia se desculpar, não tão rápido. E era ela
quem devia desculpas, não era? Ela escondeu o laboratório. Ela…
— Não
devia ter gritado com você. – ele afagou se cabelo embolado. – eu… você estava
aqui fora me protegendo dessas… disso tudo. E eu… perdoe-me.
— Claro
que sim. Você é meu pai. – ela o olhou, e sorriu fracamente.
Archie
suspirou de alívio, sua irmã estava salva, ao contrário dele mesmo. Tinha
certeza que seu pai levaria mais de um mês para perdoá-lo, mesmo que o tenha
protegido como Amy fez. Claro, ele era o homem, e era o mais velho. E devia ser
responsável. E gritou com ele. E descobriu sobre Liv. E escondeu toda a
brincadeira da irmã.
Perdido
era uma palavra bem pequena para o estado dele.
Mas o peso
de ver a irmã desentendida com o pai que ela tanto amava se foi. Menos um peso. Eram tantos…
— Arch.
Lá. – Theo apontou algumas aranhas.
— Vamos.
Eles
tinham que fazer algo. Só sentar e esperar seria pior.
Muito
pior.
●
Chris
queria vomitar. Foi um segundo, e tudo mudou. Seu estômago revirou, foi a
sensação mais estranha do mundo.
O cheiro
de mato queimado sumiu, e deu lugar ao cheiro comum de mato. Estava muito
escuro ali, perto de um lugar que conhecia. Deu dois passos pra frente e
afastou algumas moitas.
— É o
observatório. Cat… ele está levando-a…
— Espere,
Chris. Não podemos entrar assim do na- Lyra está aqui. Venha. – Pyro o puxou, e
poucos metros depois avistou a silhueta da irmã.
—
Infernos, Pyro, onde você estava que não segurou a coisa lá? Você é inútil,
sabia? E onde está Lílian? O que aconteceu na Aurum? Viu Theo?
— Cala a
boca, mulher! – quem disse foi Chris. – a culpa é minha, pra variar um pouco. E
Theo está inteiro e míope, do jeito que você largou lá.
— O que
você está fazendo aqui, Chris?
— Catherine está lá dentro, pelo amor de Deus!
— Isso
mesmo, grita!
Pyro
suspirou.
— Quem
mais está aqui? – perguntou. Não via as sombras.
— Eu, Tom.
— E eu-
— General
Estorvo e Redworn, dois inúteis. Encostaram em mim quando conjurei a Sellphir.
– Lyra disse.
— Temos
que entrar rápido. Sem desabar nada, ou qualquer coisa que machuque Catherine.
– Pyro tentou olhá-la.
— Uma
bagunça aqui, certo? Pois bem. Teremos uma bela bagunça aqui. Vou chamar
Varsak.
— Chame. –
Pyro incentivou.
E Chris
sentiu um arrepio, daqueles gelados, descendo pela espinha.
Eles
realmente iam chamar o dragão.
Mãe de Deus, está acabando o_o
eu sempre racho o bico desse capítulo IUEHAIUHSIUEAIUEHA
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